quinta-feira, 17 de março de 2016

Esperança Sem Limites

Já fazem dois meses e alguns dias que eu e a Kerllen estamos em São Paulo trabalhando na ONG Esperança Sem Limites.
A Kerllen e eu estamos nos adaptando muito bem, graças a Deus. 
Nossa, muita coisa já aconteceu nesse período,  tem sido uma experiência realmente impactante em vários sentidos. Apesar de já ter trabalhado com o acompanhamento de adolescentes e jovens em situação de risco,  a diferença  de intensidade é enorme, aqui a minha vida se resume a isso. Mas tudo tem sido muito bom, pois eu amo o que faço, eu amo cuidar de pessoas, apesar de que muitas vezes dá uma vontade de "rebocar eles na porrada" (risos).
Um dois meninos perguntou para mim o que é que um missionário fazia em outros países.  Eu respondi que o missionário vai para outro país para viver com o povo de lá,  sorrir, chorar, trabalhar, servir, e nos atos simples do dia Deus iria se revelando, pois Deus se revela através de quem somos no dia a dia e não só do que falamos.
Sou Pai Social de uma casa que atualmente tem 11 crianças de 12 a 17 anos, cada uma com uma historia diferente e traumas diferentes, apesar dos problemas,  tenho aprendido a lidar com eles todos os dias. Aqui tenho de ficar atento pois do nada acontece alguma confusão. 
Agora podemos dizer que somos "donos de casa" rs. Coordenamos a arrumação da casa, fazemos o café, almoço e janta.  Separamos briga, damos sermão,  aplicamos disciplina. Ufa, valeu a pena ter assistido Super Nanny. 
Meu projeto com Jiu Jitsu já está em andamento. Já temos os Kimonos, tatames e local. São muitas atividades durante o dia, mas no final de semana tenho treinado com os meninos e meninas, tentando passar para eles não só uma pratica esportiva, mas a filosofia de vida do "Bushido"(O caminho do Guerreiro), fazendo do Jiu Jistu um instrumento de disciplina e companheirismo. Cada semana tiramos um tempo para refletir sobre uma das 7 virtudes do Bushido, fazendo algumas aplicações bíblicas dentro delas.
A Kerllen vai começar a dar aulas de violão. Estamos pensando e dar algumas aulas de teatro também. 
Vou começar alguns estudos bíblicos,  vou ensinar sobre a Bíblia de maneira cronológica.
São muitos planos e projetos e vocês que oram por nós fazem parte disso também.

Faz uma semana que tivemos um treinamento sobre como cuidar de crianças e adolescentes em situação de risco com o Pr Derli, que é o diretor da Ong e tem mais de 15 anos de experiência nessa área. 
Aprendemos que a maioria dessas crianças sofrem de um Distúrbio Reativo do Apego (DRA).
A características principal desse distúrbio é a incapacidade de estabelecer relacionamentos duradouros. Ou seja,  os traumas da vida fez com que essas crianças perdessem a confiança em qualquer outra pessoa. E todas as vezes que alguém tenta se aproximar para amar, ela rejeita. Um bom exemplo seria o de um cãozinho que foi atropelado, e ataca a qualquer um que chegue perto mesmo que seja para ajudar.

A principal lição que tenho aprendido nesse tempo é a de viver um dia de cada vez. Cada dia traz o seu próprio mal, e por mais terrível que ele seja, ele vai passar no final do dia, e o amanhã reserva nossas surpresas, tanto boas quanto ruins.
Não tenho dúvidas do trabalhar de Deus com relação as coisas que estou vivendo e ainda vou viver. Cada estudo, treinamento, livro e experiência me preparando para esse lugar, e esse local esta me preparando para coisas futuras. Aqui é uma escola e tanto.
A Kerllen e eu além de estarmos muito bem em nossa vida a dois, temos tido oportunidade para desenvolver nossos talentos e vocações.

Essa semana eu fui pela primeira vez agredido fisicamente. Um dos meninos que cuido, tem passado por um período bem conturbado. Por ter DRA, quando sente que uma pessoa começa a demonstrar amor e autoridade,  seu instinto de sobrevivência repudia qualquer aproximação, pois ele aprendeu que não pode confiar em ninguém sem ser ele mesmo. 
Ele simplesmente amanheceu com a "pá virada". 
Ele passou a manhã inteira tentando fazer com que eu agredisse ele. Ele me xingou, jogou ovo na minha casa, passou cola na maçaneta da porta. Enfim... Eu continuei mantendo a calma. E aquilo que ele queria que eu fizesse,  ele acabou fazendo. O engraçado é que todos esperavam que eu desse uns  'catilitapas', 'hadukkens' nele por eu estar ensinando Jiu Jitsu. 
Ele jogou três cadeiras de madeira em mim, a primeira eu peguei, e com ela me defendi das outras duas e do cabo de vassoura.
O fato de eu não ter batido nele ou imobilizado, foi o pior golpe que ele levou.
Isso mexeu profundamente com ele. A minha mão ficou machucada devido a cadeira, mas valeu a pena. Ao invés de rejeita-lo, eu o abracei e esse foi um golpe ainda mais profundo.
Ele ainda continua nesse processo de rejeição e aceitação,  mas com certeza isso mudou muitas coisas nele. Ele pediu perdão extremamente envergonhado, ele não esperava que eu respondesse com amor as suas perguntas de ódio e essa foi a minha vitória. Quando ele me pediu perdão,  eu confesso que segurei forte para as lágrimas não descerem. E mais uma vez Deus renovou em meu coração os motivos de eu estar aqui.

Um dos meninos que mais apronta aqui, chegou comigo e perguntou de onde eu tirava tanta calma, e a única resposta que podia dar para ele, era que essa calma vinha de Deus.

Enfim, se eu fosse relatar as inúmeras coisas que aconteceram nesses dois meses, tanto meus acertos como erros, não iria parar de escrever.

Continuem orando pela nossa vida aqui nesse local, precisamos de sabedoria, discernimento e paciência para lidar com as coisas aqui.

Ore para que o nosso coração esteja sempre transbordando de Deus, pois não podemos oferecer para eles o que não temos.


Ismael e Kerllen
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